quinta-feira, 25 de outubro de 2018

Conversa de Família: a eleição está chegando


Aos meus irmãos, irmãs, sobrinhos e sobrinhas!

                                             Se vó Dochinha estivesse aqui, 
certamente se posicionaria contra estas atrocidades,
  independente da inclinação política, tem um limite a violência, 
e vó Doxinha sempre foi do amor, não há dúvidas disso


Estão vendo nós, que desde muito nos dispusemos a defender a “vida em primeiro lugar” como ameaça.

Estão vendo nós, que estamos juntos às comunidades que sempre viveram à margem, e que puderam sentir o gosto de serem tratadas como cidadãs, como cidadãos, como ameaça.

Estão vendo nós, que sempre denunciamos a degradação em larga escala de nossos ecossistemas, das matas, dos cerrados, das veredas, das caatingas e das águas associadas a estes biomas, como ameaças.

Estão vendo nós, que desde sempre estamos ao lado dos povos e comunidades que conseguiram feitos históricos de convivência com estes ecossistemas e biomas, como ameaças.

Estão vendo as lideranças que surgiram destes movimentos que pregam o “Bem Viver”, como ameaças.

Tem muita gente que diz que é brincadeirinha, mas quando a ameaça chega à caixa de correio com uma mensagem de duas mãozinhas em forma de arma dizendo que o dezessete vem aí, para “se cuidar”, então esta que poderia ser brincadeirinha, não está sendo assim traduzida por aqueles que sempre nos veem como uma ameaça.

Estamos vivendo tempos que precisamos engolir espinhos. O meu já está na goela e não tenho dúvidas que vou engolir. Vou votar no Anastasia para governador, o mesmo que se juntou com o Aécio, o playboy de Ipanema, o que não teve a hombridade de aceitar o resultado das eleições e se envolveu na grande onda que criou o antipetismo e, assim, conseguiu a deposição de Dilma como presidenta legitimamente eleita. Pois vou votar no Anastasia, o mesmo que teve o descaramento de, como relator, elaborar o voto pelo impedimento de Dilma Rousseff utilizando de justificativas jurídicas fantasiosas que ele mesmo descumpriu.

Vou votar no Anastasia porque sei que o outro candidato está no mesmo barco que o do 17. E do candidato 17, este que você não precisa inventar mentiras para saber o que ele pensa ou como ele age. O que ele pensa e defende não precisa ser inventado, pois sai de sua própria boca, não sai de reportagens ou imagens maquiadas. É de sua própria boca. Como a que escutei hoje cedo, tipificando os que lutam pelos direitos como terroristas, e que vai colocar as forças policiais nos nossos lombos. Se não estivermos satisfeitos, que rumemos para outros países.

Em 1964, com onze anos de idade, eu não escutei estas palavras, mas fui surpreendido na madrugada de uma manhã, quando estava internado no Seminário Pio XII, em Sete Lagoas, com os militares que lá adentraram para prender o Padre Jorge, acusado de ser comunista. Ele ficou quase seis meses preso e no ano seguinte o seminário foi fechado e os padres espanhóis dispersados. Quando de 1965 a 1968, entre a nossa mudança para Belo Horizonte e depois retornando para Sete Lagoas, lembro de nossa mãe cedinho rezando para que seus filhos não fossem presos pois estavam envolvidos em manifestações contra a milícia montada que avançava contra as barricadas construídas pelos estudantes que lutavam denunciando a ditadura militar. Reagiam com pedras e bolinhas de gude à força das armas e da cavalaria.

Já, nos anos 1970, quando Juarez adentrou pelo Mato Grosso para trabalhar com D. Pedro Casaldáliga, na prelazia de São Felix do Araguaia, nossa mãe saiu de Sete Lagoas para ir defender o Juarez, nosso irmão, ameaçado. Ameaçado por quem? Pelos policiais comprometidos com os interesses dos latifundiários e grandes empresários que estavam massacrando os posseiros que lutavam pelo direito à terra. Esta mesma mãe que, junto com o nosso irmão Gegê, movimentou Deus e o mundo para que eu fosse transferido da UFRGS para a UFV, inclusive com um detalhe que só muito recentemente Dilza me contou, o esforço que fizeram para limpar a minha ficha no Dops, em função do IPM que foi montado pelo caso da “árvore”. Foi só depois, com a “ficha limpa”, é que foi possível a minha transferência para Viçosa e lá poder terminar o curso de agronomia.

Percorro uma parcela de nossa história, da história de nossa família, para lembrar a trajetória de posicionamento social e político e não precisarmos de nos desculpar mais à frente, ou achar uma desculpa conveniente quando não se puder mais voltar atrás, ou mesmo dizer que não tem culpa pelo que aconteceu, quando a violência prosperar sem medida, a repressão perder o controle sobre os militares e sobre os militantes da extrema direita. A ameaça que eles fazem hoje nas escondidas pode ser um prélio do que pode vir a acontecer.

Já estamos quase que num caminho sem volta, beirando a guerra civil, pois fomos jogados em um extremismo sem controle. Acionados por um antipetismo que beira a raia da irracionalidade. E sabemos de onde vem este antipetismo. Uma parcela deles não tem como alterar, pois foram gentes nossas que tiveram suas mentes manipuladas pela inteligência artificial, pela guerra digital que captou seus temores, seus desejos e suas “desilusões”, as transformando em raiva, em ódio, na construção de uma crença de que precisam mesmo de varrer os petistas do planeta. Mas outra não, outra parcela são de gentes que discordam de fundo com as políticas do PT, inclusive as de inclusão social, ou de gentes que não aceitaram o fato de uma parcela do PT ter entrado na mesma onda daqueles que sempre combatemos, se conspurcando com o regime posto, afirmando que os fins justificam os meios.

É para estes que dirijo esta mensagem. Assim como estou a engolir um espinho de baleia votando no Anastasia para governador, peço que reflitam sobre a consequência do voto no 17 para presidente. Se o espinho for grande demais, então pelo menos vote em branco ou anule o voto. Menos mal, mas vivemos um tempo que não se pode ficar em cima do muro. A votação é mais que no PT, é votação para mantermos o regime democrático ameaçado por setores corporativos entre estes, os ligados à segurança, ao armamentismo, o sistema financeiro e o grande capital que quer explorar a totalidade de nossa natureza vista apenas como recursos.  

Indiferente dos resultados, vamos viver tempos muito difíceis, tempos onde a única arma de força que temos para ser acionada é a do amor e a da paz. Mas, se a eleição confirmar o 17, aí a volta, se é que seja possível, só vai acontecer com muito sofrimento. E este sofrimento não vai ficar, como até então sempre aconteceu, sentido apenas pelas classes populares. Todos vamos sentir, de uma forma ou de outra. Ainda é tempo. Termino pensando aqui comigo se nossa mãe tivesse viva, se ela pudesse dizer alguma coisa para nós, filhos, netos e bisnetos, como ela se posicionaria frente às ameaças que se prenuncia. Ouvi de um dos meus filhos que, “independente da inclinação política, tem um limite que é a violência, e vó Doxinha sempre foi do amor, não há dúvidas disso”.  

Com muito carinho,

                                   do tio Carlinhos

Montes Claros, no dia 22 de outubro de 2018


quarta-feira, 3 de outubro de 2018

A democracia como a conhecíamos, virou coisa do passado. Mas, nem tudo está perdido



A reta final do primeiro turno das eleições no Brasil mostrou que a democracia resta como coisa do passado. Pelo menos da forma como a concebíamos. Se antes, estávamos a mercê do poder que financiava os candidatos e os partidos, da inteligência fina que guiavam os discursos, o marketing e a articulação dos bastidores, com regras desenvolvidas para controle do financiamento da campanha, do uso do tempo na tevê, da propaganda de rua, cartazes, murais, carros sons, boca de urna, as estratégias atuais deixaram estas práticas e temas em uma fragrante obsolescência.


As campanhas ficaram muito mais complexas e as formas de indução do cidadão muito mais sofisticadas. A individualização da campanha vai chegando a extremos nunca imaginados. E é sob o manto da individualização que o arsenal tecnológico e financeiro constrói os caminhos que os cidadãos vão trilhar, acionando o poder da mídia, do judiciário, dos empresários, dos pastores ou das igrejas. 

Ações orquestradas e descentralizadas, utilizando profissionais de marketing associados com militantes e robôs digitais são capazes de, com nos informa Plínio Teodoro (https://www.revistaforum.com.br/como-funcionam-os-grupos-de-whatsapp-de-apoio-a-bolsonaro/), em poucas horas, desencadear uma guerra relâmpago transformando os louros de manifestações massivas de rua, como a que vimos no último final de semana em favor do “#EleNão, em rápidas mudança de opinião de milhares ou mesmo de milhões de cidadãos e cidadãs menos desavisadas acerca da guerra digital em curso.


Guerra digital que está acoplada nos algoritmos que definem o que você vai ver ou ler, enquanto é absorvido no seu caminhar para casa ou para o trabalho, na escola, nas ruas, nos ônibus, metrôs, salas de aula, barzinhos, reuniões de trabalho, nas roças e até mesmo nos passeios ao ar livre. Pois é assim hoje, as pessoas cabisbaixas e conectadas, porém, sem saber que estão sendo plugadas ao abismo do totalitarismo, do liberalismo ao extremo que nenhum interesse tem nos valores que, até então, guiaram nossa crença na democracia.


Mas, a democracia não está perdida, pois os confrontos dos processos eleitorais explicitam também os conflitos de interesses e de classes, exigindo uma atualização da humanidade que habita em todos nós, habitantes que somos deste mundo que clama vida para todos. E é esta resistência presente em nossa humanidade que põe de forma inusitada a sociedade a se movimentar como a que estamos vendo aqui no Norte de Minas, no Semiárido Mineiro, no estado de Minas Gerais.

E, entre estas movimentações, a ousadia que foi o lançamento de Leninha como candidata a deputada estadual pelo Partido dos Trabalhadores. Oriunda da periferia, mulher negra, há muitos anos ela vem trabalhando com as comunidades rurais no Norte de Minas, no Vale do Jequitinhonha e em toda Minas Gerais e no Brasil a partir de sua atuação em redes sociais como a Rede de Convivência com o Semiárido, Articulação Mineira de Agroecologia, Conselho Estadual e Nacional de Segurança Alimentar. Mesmo sem nunca ter entrado na política diretamente, sempre esteve  batalhando por mudanças na sociedade, em particular, na busca de um mundo e de uma sociedade ecologicamente sustentável, com os direitos das pessoas sendo reconhecidos e respeitados,  uma luta imensa para diminuir as desigualdades sociais e econômicas que se mantêm incrustadas em nosso meio.

Há dois anos solicitaram para ela compor uma chapa como vice-prefeita para a prefeitura de Montes Claros. Aceitou muito relutante, teve que ser animada para aceitar e, por uma conjuntura local, a menos de um mês das eleições, ela passou a ser candidata a prefeita. Um grande círculo de pessoas foi criado, ela teve em Montes Claros uma votação expressiva, quase 40 mil votos. Votação que nos surpreendeu a todos, principalmente pelo abrangente clima positivo que se criou em torno do projeto que ela defendia.

Este processo que aconteceu em Montes Claros contribuiu para levar para outras regiões do estado, para outras comunidades, este projeto como substância para uma possível candidatura como deputada estadual. Um círculo maior de pessoas entrou na construção deste projeto que, agora, estamos defendendo: a luta pela humanidade socioambiental que hoje nos faz mover para um mundo possível de se viver.

Esta luta está mobilizando centenas e centenas de pessoas, que fazem o trabalho militante, de casa em casa, de comunidade em comunidade, de bairro em bairro, em escolas, fábricas e universidades. Que acionam redes de informação e de formação com o debate e convencimento não apenas para o voto mas, principalmente, para entrar nesta rede de mudança social.

Campanha que vem conseguindo se atualizar, mas sem perder de vista os valores que sustentam a luta pelo avanço da democracia, pela equidade socioeconômica, pelo reconhecimento da diversidade sociocultural e, principalmente, pela responsabilidade ambiental ao nos reconhecermos parte da complexa dinâmica que sustenta a vida no planeta. E dela todos também devemos cuidar.




Para saber mais sobre ela, acessem:

https://www.youtube.com/watch?v=ePvoJ-vCGwM

https://www.youtube.com/watch?v=5FQ5eMbV1Cc