sábado, 19 de junho de 2021

MEUS CAROS IRMÃOS PIRIÁS!

 

O cerrado

                o mato

                           o sebastião e seu irmão

irmãos de gema e sol

                           o sebastião e seu irmão

dos passarinhos

ah, dos passarinhos que caçavam

na infância carregando a vida a fora

como se o destino não fosse determinado

nas crianças de pés de no chão

    do sebastião e seu irmão

 

Desde cedo se adulterando ao destino criado

de uma infância que nunca chegaram a compreender

as caçadas, as caçadas que de caçadas em caçadas

se tornaram caçados como bandidos

que se veste de amarelo a mando do soldo

de capitalistas e fazendeiros

 

ah, como compreenderam os irmãos e pena

não atingissem os alvos principais

nos seus desesperos pelos matos e cerrados

seus alimentos de piriás, e como piriás se escondendo

e a gente boa do sertão

seus iguais, os peões, lavradores, gente simples

trazendo um copo de água, um prato de comida e munição

que a deles sozinha não fora o suficiente

 

ah, precisaria de mais e mais

de mais iguais na mesma razão

o mesmo amor pelas madrugadas fraternais

pelos caminhos que só as estrelas e o sol podem revelar

e os irmãos piriás lutaram como heróis

valentia incompreensível aos cientistas das misérias

com seus cães, helicópteros, rádios e fuzis

automóveis, bebedeiras e bacanais

 

ah, irmãos piriás

contra quem vocês estavam lutando

quando no mato cantavam cantigas caipiras bem baixinho

deixando marcas de sandálias de solas de pneus

rastro de suas ousadias, rastro de sangue

vingança infantil reveladas em tiros na testa

da maldade mais próxima, e o cansaço dos meses

de perseguição se fazendo sentir e  à frente

foram indo, foram indo, foram indo,

que em suas companhias sem saber tinham outros irmãos

muitos irmãos heróis de favelas e cangaço

nos bordéis, botequins, fábricas e construções

torcendo pela suas vidas mesmo depois que a fuzilaria

odienta dos policiais os enviaram

à gloria do futuro

                           meus caros irmãos piriás !

(João Mutengo, em um longínquo dia finalizando os anos 1970)

quinta-feira, 4 de abril de 2019

. . . BEM QUERER O BRASIL!





Conheço o João Roberto Ripper desde quando ele veio ao Norte de Minas no início dos anos 2000 fazer um registro de trabalho escravo em carvoarias. Acompanhei suas andanças no Quilombo do Gurutuba e na região do Alto Rio Pardo. O registro que ele fez teve repercussão internacional, foi parar na OIT que cobrou medidas contra o trabalho escravo no Brasil.

Dois de seus comentários quando andávamos em um "fiatizinho", que desde sempre o acompanha, era de que onde andava fazendo registro sempre buscava retornar, pois ia construindo compromissos com as pessoas do lugar. E o outro era que sempre deixava os arquivos de seus registros com as comunidades e com as organizações que ali atuavam.

Pois é o que sempre fez em suas andanças pelos sertões do Norte de Minas e nas altas serras da região de Diamantina. Só que sempre fez muito mais. Capacitou-nos, capacitou jovens e adultos na arte da fotografia e da documentação. Em cada lugar que passou vc hoje pode ir lá procurar, ou em meio digital ou em meio de papel, vc encontra os registros que ele deixa disponível para ser usado, sempre de rara sensibilidade. Ele vem cumprindo um papel fundamental na formação de comunicadores populares por onde passa.

Agora ele está com um projeto muito mais ousado: organizar e disponibilizar seu vasto acervo, de décadas de trabalho no Brasil, para uso das organizações dos povos e comunidades tradicionais, de seus movimentos, das entidades que as apoiam e de grupos de pesquisa.

Vamos apoiar divulgando e contribuindo!!!!



Visite o link acima, está lá escrito assim na introdução:

Com quase 50 anos de documentação, João Roberto Ripper dedicou sua vida a contar as histórias abafadas ou esquecidas do país. As histórias de injustiças contra crianças e adultos em situação de escravidão; as histórias sobre as dificuldades da seca no semi-árido; mas também as histórias de força das lutas dos movimentos sociais e populações tradicionais pelo Brasil. Nosso objetivo com esta campanha é, em seis meses, trabalhar todo o material nativo digital, isto é, as fotografias produzidas por Ripper após sua transição da fotografia analógica para a digital, organizado e catalogado, com cada uma de suas imagens preenchidas por informações e contexto, contando a história por trás de cada uma das imagens. Este material será então doado para a Fundação Biblioteca Nacional para conservação a longo prazo e será disponibilizado para o público para consulta e pesquisa no site do fotógrafo. Cópias deste acervo também serão enviadas para entidades e instituições documentadas para auxiliar em suas lutas e reforçar suas políticas de memória. 
São cerca de 20 terabytes de arquivo, que cobrem os últimos 15 anos de sua carreira, ainda em andamento. Este projeto é parte de um projeto maior, que inclui todo o acervo de quase 50 anos de Ripper, que contabiliza em mais de 140 mil fotogramas em filme e dezenas de cadernos de campo. Este é nosso primeiro passo na direção de assegurar essa parte importante da memória do Brasil conservada e acessível a todos e todas.


quinta-feira, 25 de outubro de 2018

Conversa de Família: a eleição está chegando


Aos meus irmãos, irmãs, sobrinhos e sobrinhas!

                                             Se vó Dochinha estivesse aqui, 
certamente se posicionaria contra estas atrocidades,
  independente da inclinação política, tem um limite a violência, 
e vó Doxinha sempre foi do amor, não há dúvidas disso


Estão vendo nós, que desde muito nos dispusemos a defender a “vida em primeiro lugar” como ameaça.

Estão vendo nós, que estamos juntos às comunidades que sempre viveram à margem, e que puderam sentir o gosto de serem tratadas como cidadãs, como cidadãos, como ameaça.

Estão vendo nós, que sempre denunciamos a degradação em larga escala de nossos ecossistemas, das matas, dos cerrados, das veredas, das caatingas e das águas associadas a estes biomas, como ameaças.

Estão vendo nós, que desde sempre estamos ao lado dos povos e comunidades que conseguiram feitos históricos de convivência com estes ecossistemas e biomas, como ameaças.

Estão vendo as lideranças que surgiram destes movimentos que pregam o “Bem Viver”, como ameaças.

Tem muita gente que diz que é brincadeirinha, mas quando a ameaça chega à caixa de correio com uma mensagem de duas mãozinhas em forma de arma dizendo que o dezessete vem aí, para “se cuidar”, então esta que poderia ser brincadeirinha, não está sendo assim traduzida por aqueles que sempre nos veem como uma ameaça.

Estamos vivendo tempos que precisamos engolir espinhos. O meu já está na goela e não tenho dúvidas que vou engolir. Vou votar no Anastasia para governador, o mesmo que se juntou com o Aécio, o playboy de Ipanema, o que não teve a hombridade de aceitar o resultado das eleições e se envolveu na grande onda que criou o antipetismo e, assim, conseguiu a deposição de Dilma como presidenta legitimamente eleita. Pois vou votar no Anastasia, o mesmo que teve o descaramento de, como relator, elaborar o voto pelo impedimento de Dilma Rousseff utilizando de justificativas jurídicas fantasiosas que ele mesmo descumpriu.

Vou votar no Anastasia porque sei que o outro candidato está no mesmo barco que o do 17. E do candidato 17, este que você não precisa inventar mentiras para saber o que ele pensa ou como ele age. O que ele pensa e defende não precisa ser inventado, pois sai de sua própria boca, não sai de reportagens ou imagens maquiadas. É de sua própria boca. Como a que escutei hoje cedo, tipificando os que lutam pelos direitos como terroristas, e que vai colocar as forças policiais nos nossos lombos. Se não estivermos satisfeitos, que rumemos para outros países.

Em 1964, com onze anos de idade, eu não escutei estas palavras, mas fui surpreendido na madrugada de uma manhã, quando estava internado no Seminário Pio XII, em Sete Lagoas, com os militares que lá adentraram para prender o Padre Jorge, acusado de ser comunista. Ele ficou quase seis meses preso e no ano seguinte o seminário foi fechado e os padres espanhóis dispersados. Quando de 1965 a 1968, entre a nossa mudança para Belo Horizonte e depois retornando para Sete Lagoas, lembro de nossa mãe cedinho rezando para que seus filhos não fossem presos pois estavam envolvidos em manifestações contra a milícia montada que avançava contra as barricadas construídas pelos estudantes que lutavam denunciando a ditadura militar. Reagiam com pedras e bolinhas de gude à força das armas e da cavalaria.

Já, nos anos 1970, quando Juarez adentrou pelo Mato Grosso para trabalhar com D. Pedro Casaldáliga, na prelazia de São Felix do Araguaia, nossa mãe saiu de Sete Lagoas para ir defender o Juarez, nosso irmão, ameaçado. Ameaçado por quem? Pelos policiais comprometidos com os interesses dos latifundiários e grandes empresários que estavam massacrando os posseiros que lutavam pelo direito à terra. Esta mesma mãe que, junto com o nosso irmão Gegê, movimentou Deus e o mundo para que eu fosse transferido da UFRGS para a UFV, inclusive com um detalhe que só muito recentemente Dilza me contou, o esforço que fizeram para limpar a minha ficha no Dops, em função do IPM que foi montado pelo caso da “árvore”. Foi só depois, com a “ficha limpa”, é que foi possível a minha transferência para Viçosa e lá poder terminar o curso de agronomia.

Percorro uma parcela de nossa história, da história de nossa família, para lembrar a trajetória de posicionamento social e político e não precisarmos de nos desculpar mais à frente, ou achar uma desculpa conveniente quando não se puder mais voltar atrás, ou mesmo dizer que não tem culpa pelo que aconteceu, quando a violência prosperar sem medida, a repressão perder o controle sobre os militares e sobre os militantes da extrema direita. A ameaça que eles fazem hoje nas escondidas pode ser um prélio do que pode vir a acontecer.

Já estamos quase que num caminho sem volta, beirando a guerra civil, pois fomos jogados em um extremismo sem controle. Acionados por um antipetismo que beira a raia da irracionalidade. E sabemos de onde vem este antipetismo. Uma parcela deles não tem como alterar, pois foram gentes nossas que tiveram suas mentes manipuladas pela inteligência artificial, pela guerra digital que captou seus temores, seus desejos e suas “desilusões”, as transformando em raiva, em ódio, na construção de uma crença de que precisam mesmo de varrer os petistas do planeta. Mas outra não, outra parcela são de gentes que discordam de fundo com as políticas do PT, inclusive as de inclusão social, ou de gentes que não aceitaram o fato de uma parcela do PT ter entrado na mesma onda daqueles que sempre combatemos, se conspurcando com o regime posto, afirmando que os fins justificam os meios.

É para estes que dirijo esta mensagem. Assim como estou a engolir um espinho de baleia votando no Anastasia para governador, peço que reflitam sobre a consequência do voto no 17 para presidente. Se o espinho for grande demais, então pelo menos vote em branco ou anule o voto. Menos mal, mas vivemos um tempo que não se pode ficar em cima do muro. A votação é mais que no PT, é votação para mantermos o regime democrático ameaçado por setores corporativos entre estes, os ligados à segurança, ao armamentismo, o sistema financeiro e o grande capital que quer explorar a totalidade de nossa natureza vista apenas como recursos.  

Indiferente dos resultados, vamos viver tempos muito difíceis, tempos onde a única arma de força que temos para ser acionada é a do amor e a da paz. Mas, se a eleição confirmar o 17, aí a volta, se é que seja possível, só vai acontecer com muito sofrimento. E este sofrimento não vai ficar, como até então sempre aconteceu, sentido apenas pelas classes populares. Todos vamos sentir, de uma forma ou de outra. Ainda é tempo. Termino pensando aqui comigo se nossa mãe tivesse viva, se ela pudesse dizer alguma coisa para nós, filhos, netos e bisnetos, como ela se posicionaria frente às ameaças que se prenuncia. Ouvi de um dos meus filhos que, “independente da inclinação política, tem um limite que é a violência, e vó Doxinha sempre foi do amor, não há dúvidas disso”.  

Com muito carinho,

                                   do tio Carlinhos

Montes Claros, no dia 22 de outubro de 2018


quarta-feira, 3 de outubro de 2018

A democracia como a conhecíamos, virou coisa do passado. Mas, nem tudo está perdido



A reta final do primeiro turno das eleições no Brasil mostrou que a democracia resta como coisa do passado. Pelo menos da forma como a concebíamos. Se antes, estávamos a mercê do poder que financiava os candidatos e os partidos, da inteligência fina que guiavam os discursos, o marketing e a articulação dos bastidores, com regras desenvolvidas para controle do financiamento da campanha, do uso do tempo na tevê, da propaganda de rua, cartazes, murais, carros sons, boca de urna, as estratégias atuais deixaram estas práticas e temas em uma fragrante obsolescência.


As campanhas ficaram muito mais complexas e as formas de indução do cidadão muito mais sofisticadas. A individualização da campanha vai chegando a extremos nunca imaginados. E é sob o manto da individualização que o arsenal tecnológico e financeiro constrói os caminhos que os cidadãos vão trilhar, acionando o poder da mídia, do judiciário, dos empresários, dos pastores ou das igrejas. 

Ações orquestradas e descentralizadas, utilizando profissionais de marketing associados com militantes e robôs digitais são capazes de, com nos informa Plínio Teodoro (https://www.revistaforum.com.br/como-funcionam-os-grupos-de-whatsapp-de-apoio-a-bolsonaro/), em poucas horas, desencadear uma guerra relâmpago transformando os louros de manifestações massivas de rua, como a que vimos no último final de semana em favor do “#EleNão, em rápidas mudança de opinião de milhares ou mesmo de milhões de cidadãos e cidadãs menos desavisadas acerca da guerra digital em curso.


Guerra digital que está acoplada nos algoritmos que definem o que você vai ver ou ler, enquanto é absorvido no seu caminhar para casa ou para o trabalho, na escola, nas ruas, nos ônibus, metrôs, salas de aula, barzinhos, reuniões de trabalho, nas roças e até mesmo nos passeios ao ar livre. Pois é assim hoje, as pessoas cabisbaixas e conectadas, porém, sem saber que estão sendo plugadas ao abismo do totalitarismo, do liberalismo ao extremo que nenhum interesse tem nos valores que, até então, guiaram nossa crença na democracia.


Mas, a democracia não está perdida, pois os confrontos dos processos eleitorais explicitam também os conflitos de interesses e de classes, exigindo uma atualização da humanidade que habita em todos nós, habitantes que somos deste mundo que clama vida para todos. E é esta resistência presente em nossa humanidade que põe de forma inusitada a sociedade a se movimentar como a que estamos vendo aqui no Norte de Minas, no Semiárido Mineiro, no estado de Minas Gerais.

E, entre estas movimentações, a ousadia que foi o lançamento de Leninha como candidata a deputada estadual pelo Partido dos Trabalhadores. Oriunda da periferia, mulher negra, há muitos anos ela vem trabalhando com as comunidades rurais no Norte de Minas, no Vale do Jequitinhonha e em toda Minas Gerais e no Brasil a partir de sua atuação em redes sociais como a Rede de Convivência com o Semiárido, Articulação Mineira de Agroecologia, Conselho Estadual e Nacional de Segurança Alimentar. Mesmo sem nunca ter entrado na política diretamente, sempre esteve  batalhando por mudanças na sociedade, em particular, na busca de um mundo e de uma sociedade ecologicamente sustentável, com os direitos das pessoas sendo reconhecidos e respeitados,  uma luta imensa para diminuir as desigualdades sociais e econômicas que se mantêm incrustadas em nosso meio.

Há dois anos solicitaram para ela compor uma chapa como vice-prefeita para a prefeitura de Montes Claros. Aceitou muito relutante, teve que ser animada para aceitar e, por uma conjuntura local, a menos de um mês das eleições, ela passou a ser candidata a prefeita. Um grande círculo de pessoas foi criado, ela teve em Montes Claros uma votação expressiva, quase 40 mil votos. Votação que nos surpreendeu a todos, principalmente pelo abrangente clima positivo que se criou em torno do projeto que ela defendia.

Este processo que aconteceu em Montes Claros contribuiu para levar para outras regiões do estado, para outras comunidades, este projeto como substância para uma possível candidatura como deputada estadual. Um círculo maior de pessoas entrou na construção deste projeto que, agora, estamos defendendo: a luta pela humanidade socioambiental que hoje nos faz mover para um mundo possível de se viver.

Esta luta está mobilizando centenas e centenas de pessoas, que fazem o trabalho militante, de casa em casa, de comunidade em comunidade, de bairro em bairro, em escolas, fábricas e universidades. Que acionam redes de informação e de formação com o debate e convencimento não apenas para o voto mas, principalmente, para entrar nesta rede de mudança social.

Campanha que vem conseguindo se atualizar, mas sem perder de vista os valores que sustentam a luta pelo avanço da democracia, pela equidade socioeconômica, pelo reconhecimento da diversidade sociocultural e, principalmente, pela responsabilidade ambiental ao nos reconhecermos parte da complexa dinâmica que sustenta a vida no planeta. E dela todos também devemos cuidar.




Para saber mais sobre ela, acessem:

https://www.youtube.com/watch?v=ePvoJ-vCGwM

https://www.youtube.com/watch?v=5FQ5eMbV1Cc


quinta-feira, 19 de abril de 2018

MST, A LUTA É PRÁ VALER!

O MST plantou na Estrada da Produção, a não mais que 5 km de Montes Claros, Norte de Minas Gerais, uma ocupação onde quase uma centena de famílias de sem terra vindas de Francisco Sá, Capitão Enéas e Montes Claros fincaram os pés na esperança de ali reconstruírem suas vidas. Crianças de colo e outras já crescidas correndo pela terra vermelha.  Senhoras, senhores, jovens, adultos e idosos carregados de vontade de cultivar a terra. Do outro lado, a soberba elite de mãos finas, chapéus a la cowboy, óculos escuros, botinas de salto alto, aspergindo ódio, guardados por generais aposentados ...


A ocupação durou pouco, mas, o suficiente para se plantar, na Estrada da Produção, a certeza de que a esperança nos olhares espantados das crianças e jovens, das mulheres e dos homens, todos em luta pela vida e pelo direito de viver com dignidade é muito maior. Esta semente é nossa esperança, esta é a bandeira que o MST empunha. ... MST, A LUTA É PARA VALER!!!   


quarta-feira, 17 de janeiro de 2018

As Veredas de Minas fenecem, os Gerais se acabam: Pimentel, não sancione o Projeto de Lei 2.674/2015


Os Povos e Comunidades Tradicionais que vivem nos Cerrados e Veredas de Minas Gerais vêm a público denunciar a aprovação, pela Assembleia Legislativa de Minas Gerais, do Projeto de Lei 2.674/2015, que encontra-se em fase final para sanção do Governador Pimentel.
Este projeto de Lei atinge diretamente os interesses das comunidades tradicionais geraizeiras, veredeiras, quilombolas e indígenas que vivem nas regiões dos cerrados de Minas Gerais. O agronegócio, não satisfeito com a ampla devastação promovida sobre os cerrados de nosso estado, com o desmatamento, plantio de vastas monoculturas de soja, milho, café, cana, capim e eucalipto, contaminação dos solos e das águas com produtos químicos de toda ordem, assoreamento e secamento de centenas de córregos e rios, agravados ainda mais pela perfuração de poços artesianos, remete suas armas para ao legislativo e executivo de Minas Gerais. A exemplo do que já fizeram com o pequizeiro, considerado planta símbolo de Minas Gerais, conseguiram desta vez colocar em pauta o Projeto de Lei 2.674/2015 que autoriza “o corte, a extração e a supressão do buriti” maquiado como caso de “interesse social” visando a “reservação de água”, abrindo assim uma frente para autorização legal de barramentos que vão atender os interesses dos irrigantes, em áreas ambientalmente sensíveis e em regiões atingidas pela escassez hídrica face aos abusos da grande irrigação (em anexo, a Redação Final do Projeto de Lei e a nota IrrigaNews).
Solicitamos ao Governador Eduardo Pimentel que não sancione tal lei sem antes promover uma ampla consulta aos povos e comunidades tradicionais que vivem nos cerrados de Minas Gerais, em acordo com a Lei Estadual 21.147 que instituiu a Política Estadual para o Desenvolvimento Sustentável dos Povos e Comunidades Tradicionais de Minas Gerais; o Decreto 6040 de Desenvolvimento Sustentável de Povos e Comunidades Tradicionais, bem como a Convenção 169 da Organização Internacional do Trabalho.
Articulação Rosalino de Povos e Comunidades Tradicionais
Movimento Geraizeiro
Movimento Veredeiros

Norte de Minas Gerais, aos dia 22 de dezembro de 2017



Anexos
     PARECER DE REDAÇÃO FINAL DO PROJETO DE LEI Nº 2.674/2015

COMISSÃO DE REDAÇÃO
Projeto de Lei nº 2.674/2015, de autoria do deputado Fabiano Tolentino, que altera a Lei nº 13.635, de 12 de julho de 2000, que declara o buriti de interesse comum e imune de corte e dá outras providências, foi aprovado no 2º turno, com as Emendas nºs 1 a 3 ao vencido no 1º turno.
Vem agora o projeto a esta comissão, a fim de que, segundo a técnica legislativa, seja dada à matéria a forma adequada, nos termos do § 1º do art. 268 do Regimento Interno.
Assim sendo, opinamos por se dar à proposição a seguinte redação final, que está de acordo com o aprovado.
Altera a Lei nº 13.635, de 12 de julho de 2000, que declara o buriti de interesse comum e imune de corte e dá outras providências.
A Assembleia Legislativa do Estado de Minas Gerais decreta:
Art. 1º – O art. 1° da Lei nº 13.635, de 12 de julho de 2000, passa a vigorar com a seguinte redação:
Art. 1º – Fica declarada de interesse comum e imune de corte no Estado a palmeira buriti – Mauritia sp.
§ 1º – O corte, a extração e a supressão do buriti serão admitidos, excepcionalmente, mediante prévia autorização do órgão ambiental competente, nas seguintes situações:
I – nos casos de utilidade pública, previstos no inciso I do art. 3º da Lei 20.922, de 16 de outubro de 2013;
II – nos casos de interesse social previstos nas alíneas “e” e “g” do inciso II do art. 3º da Lei nº 20.922, de 2013, para reservação de água, quando esta espécie ocorrer desassociada do ambiente típico de veredas.
§ 2º – Nas áreas urbanas, a autorização de que trata o § 1º poderá ser concedida pelo órgão municipal competente, observado o disposto nesta lei.”.
Art. 2º – Fica acrescentado à Lei nº 13.635, de 2000, o seguinte art. 2º-A:
Art. 2º-A – A supressão do buriti será compensada por uma das opções a seguir:
I – pelo plantio de duas a cinco mudas de buriti por espécime suprimido, em área de vereda preferencialmente alterada, consideradas a frequência e a distribuição natural da espécie na área receptora, conforme dispuser a autorização do órgão ambiental competente;
II – pelo recolhimento de 100 (cem) Unidades Fiscais do Estado de Minas Gerais – Ufemgs –, por árvore a ser suprimida, à Conta de Arrecadação da Reposição Florestal de que trata o art. 79 da Lei nº 20.922, de 16 de outubro de 2013.”.
Art. 3º – Esta lei entra em vigor na data de sua publicação.
Sala das Comissões, 19 de dezembro de 2017.
Gilberto Abramo, presidente - Tadeu Martins Leite, relator - Cássio Soares.









2  Nota IrrigaNews




segunda-feira, 1 de janeiro de 2018

ENFRENTANDO DO GOLPE COM AS ARMAS ERGUIDAS: NÃO À CULTURA DO SILÊNCIO!

Zeferino, de Henfil. Fonte: https://admbrasileira.wordpress.com/2015/11/03/o-significado-do-traco-de-henfil-e-seus-personagens/comment-page-1/

Conversando com os meus amigos sobre o contexto atual do Brasil, me veio por diversas vezes a frase – vamos desenterrar as garruchas ... vamos desenferrujar as garruchas! De fato, este era o sentimento que brotava ao assistir quase diariamente os jornais das emissoras dos canais de TV aberta: Band, Record, SBT, Globo. Reportagens e comentários cínicos que vieram desconstruindo no dia-a-dia, de forma acintosa, as conquistas populares que, ao serem garantidas na Constituição de 1988, em sua maioria não tinham saído do papel. Mesmo que muito parcialmente, vimos o Governo Lula vir abrindo esta agenda, onde educação, renda, saúde, habitação, luz elétrica, direito das mulheres, dos afrodescendentes, entre outras pautas e mesmo que discordando do enfoque dado à algumas destas pautas, elas foram abertas.

Foram meses e meses, desde  a re-eleição de Dilma, que a mídia elegeu os alvos e passou a atirar de forma inclemente no PT, no combate à corrupção. E foi atirando contra estes alvos, de forma seletiva e cruel para atingir o que poderia representar o avanço democrático, mantendo a estrutura carcomida da corrupção desde sempre presente no executivo, legislativo e judiciário brasileiro. Esperávamos o povo sair às ruas em defesa dos direitos ameaçados mas, salvo a resistência digna e firme pelos movimentos sociais mais organizados, pela expressão viva dos povos indígena, das mulheres e da juventude, o que vimos foi o silêncio sendo imposto exatamente pelos meios que deveriam ser a expressão das liberdades democráticas.

Era então, frente a estes momentos de desilusão, que as imagens das garruchas sendo desenterradas, desenferrujadas, vieram à mente. Fazendo menção ao mesmo sentimento que, no final dos anos 1960 e início dos anos 1970, tomou o coração e a alma de milhares de brasileiros que optaram pela luta armada.

O aprendizado, o duro aprendizado deste período, aprendizado que é reforçado ainda nos dias de hoje quando vemos o Ocidente, através de sua expressão armada, os Estados Unidos da América, bombardear o Iraque, a Líbia, a Síria: é pelo campo da violência que as forças conservadoras nos derrotam. A violência é intrínseca a este regime onde economia e guerra não passam de faces de uma mesma moeda. 

Ouvindo outro dia um debate promovido pela TV Assembléia de Minas Gerais foi que conheci o pensamento de Venício Lima, por ele mesmo. Uma abordagem que ajuda a entender de forma muito atualizada o contexto das contradições políticas da sociedade brasileira que, desde sempre, sufocou e continua sufocando com as forças das armas toda e qualquer tentativa de levante. Assim como aconteceu com a Guerra dos Mascates, com Guerra de Canudos, Contestado, Trombas, Guerrilha do Araguaia, a violência é a mesma, ocasionalmente mudando as armas ou o formato ou o calibre das balas. Como nos aponta Venício Lima, o imbricamento umbilical entre comunicação e política na democracia contemporânea é uma das armas mais potentes na manutenção do silêncio.